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Carnis Valles e o ano que começa


Aproveitando a data, reedito aqui um texto antigo que escrevi que se mostra bem atual. Até poderia ter escrito hoje. O carnaval, a semana santa e a quaresma são elementos do mesmo bloco, desfilam na mesma escola e rezam do mesmo samba. A semana santa tem, no término do carnaval, o marco inicial da quaresma (quarenta dias de jejum) - quarta-feira de cinzas.  

Ainda que em tempos remotos, as marchinhas marcaram época, de Chiquinha Gonzaga pra cá muitos foram os abre alas, e aqueles da lira, não podemos negar, pediram passagem à rosa de ouro. E aqui, quem sabe ela, atravessando o deserto do saara tivesse ecoado...mas que calor ô ô ô ô ô ô. Que venha do Egito, das bases do samba, do crioulo doido, ô ô ô ô Aurora. Veja só que bom que era o balancê.

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Opa, mas aqui já estamos com Braguinha cantarolando: entra na roda morena pra ver, ô balance, balance! E quando por mim você passa (fingindo que não me vê), meu coração quase se despedaça. Ah, e se fosse a saudade que me invade (lá na bandeira branca amor) eu peço paz.  

Já estou em outro embalo, ainda que saiba que cachaça não é água não, ainda que venha do alambique. Pode me faltar o amor. Há, há, há, há. Isto até acho graça! Só não quero que me falte, a danada da cachaça.

Por certo, o que não faltava era cabelo ao Zezé maomé, bossa nova (será que ele é?) Só sabemos que bacana era a Chiquita, aquela lá da Martinica, com casca de banana nanica... ainda que triste (mas o que foi que te aconteceu?)

Vem jardineira, vem meu amor...O carnaval dos prazeres (valles), das carnes (carnis). Carnis Valles, ô abre alas, que eu quero passar!

Direito à troca e direito de arrependimento: como fazer?

Carnaval em regra é dia de festa. O que se denominou de festa popular movimenta milhões, encanta o mundo. É mágico! Magia da beleza do carnaval, a arte protagonista de enredos e alegorias. Uma festa celebrada na véspera com veemência, o carnaval de terça-feira, começa na sexta. Dias antes, semanas antes, meses antes. 

O país do carnaval ainda é o mesmo que condena milhões de pessoas às filas de espera em postos de saúde; é o país de obras superfaturadas; é o país de mensaleiros; é o país dos miseráveis; é o país das desigualdades; das injustiças promovidas pela morosidade do judiciário, pelas irregularidades do executivo, pelo desinteresse do legislativo.

Nossos carnavais são outros, a população vem fantasiada de trouxa, organizada em alas da impunidade, da desigualdade, lamentando a intolerância como destaque. A corte é outra, o rei deixou de ser momo, passou a ser devoto de si mesmo, envaidecido nos seus mandos, rodeado por quem o aplaude, mas não lhe admira. O país do carnaval também é da política oportunista. Um baile de máscaras!

O samba virou sapateio, transformou nossos anseios em pandeiro. O carnaval nos fez palhaços. O mágico da avenida é também o trágico mundo real. Em tempos de carnaval, nem tudo tem graça. Afinal, já se foi o carnaval, o ano começa!

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